sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O ser inteiro onde quer que esteja e o que quer que faça

Meu pai era desembargador e tinha amor pelo trabalho e pela justiça. Fez uma carreira maravilhosa e sempre foi admirado como jurista por colegas e por juízes mais jovens. Era também um homem humilde e muito reservado. O mundo do poder judiciário carrega uma grande formalidade, com os magistrados e suas becas pretas, dentro de uma posição de destaque numa hierarquia bastante estruturada. É comum, neste ambiente, encontrarmos profissionais muitos sérios que, em prol da justiça (e mesmo da sua proteção), tentam se tornar pessoas absolutamente neutras no mundo público.

Perfeitamente aceitável, neste caso, por conta da função que exercem. Mas pensando no meu pai, apesar da sua reserva natural, nunca consegui imaginá-lo assim, neutro, soberbo, numa posição de julgador. Se fosse, tenho certeza que seus olhos, que sempre espelhavam a bondade que tinha no coração o entregaria. Talvez por isso cresci ouvindo e vendo histórias de pessoas que iam bater na porta da nossa casa, especialmente quando morávamos no interior, em busca de um auxílio, uma palavra confortadora ou até mesmo para oferecer algum presente. Coisa que o deixava profundamente irritado, diga-se de passagem. 

Associei a figura do meu pai ao tema da semana porque lembrei do dia de seu velório, em julho deste ano. Muitos colegas do Tribunal de Justiça foram lá se despedir dele. Advogados de grandes escritórios do Paraná e com nomes de reputação também estiveram lá. Um deles, amigo antigo do meu pai, chegou a fechar o escritório naquele dia, dando folga a uma grande quantidade de advogados que trabalham com ele, numa linda homenagem ao amigo. Também estavam presentes muitos juízes mais jovens e outros funcionários que trabalharam uma vida inteira ao lado dele. 

Aqueles senhores sérios, nos seus ternos formais, me fizerem amar ainda mais o meu pai. Isso porque todos sabiam o meu nome e dos meus irmãos, sabiam o que nós fazíamos da vida e conheciam detalhes da dinâmica familiar. Prova de que meu pai, mesmo no ambiente público, era ele mesmo, o "Alfredão" e o "vorinho" como o chamávamos em casa. Todos foram muito carinhosos conosco e simplesmente falaram palavras lindas a respeito dele. Maravilhoso saber que ele conseguiu, apesar da  vida pública num ambiente bem formal, ser ele mesmo. Não é à toa que um dos meus sobrinhos tatuou no braço a seguinte frase: "Porque havia tanto brilho em seu olhar, mais do que seu neto me tornei seu fã".

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